.::Entrando nos anos 30 e 40::. Lucio Costa

“O Brasil não tem vocação para a mediocridade.”

Dá pra dizer que o mobiliário 100% brasileiro só foi projetado depois de 1930. As marcenárias procuravam reproduzir o que se usava no exterior, os materiais, o design. Os responsáveis pela cultura da mobilia personalizada eram influenciados principalmente pelas escolas alemãs e francesas. Com a semana de arte moderna de 1922 e a exposição da Casa Modernista construida no ano de 1928, os artistas locais começaram a valorizar um estilo totalmente brasileiro, rompendo com as influências europeias. Foi nessas décadas que revoluções também começaram a acontecer na arquitetura do país, sendo responsáveis pelo inicio dessa mudança Lucio Costa, Warchivchik e Oscar Niemayer, liderados por Le Courbisier.
Lucio Costa estudou pintura e arquitetura na Escola Nacional de Belas Artes, formando-se em 1924, seis anos mais tarde é nomeado diretor da entidade. Foi ele também responsável por trazer Warchavchik para lecionar na escola e pela modernização do ensino da arquitetura brasileira antes neocolonial, considerado por ele uma "mentira".
Acima com o livro: Registro de uma Vivência
Seu lado menos conhecido é o de designer, que, embora menor no conjunto de sua obra, revela a mesma genialidade de sua arquitetura e urbanistica. A maior parte dos móveis assinados por ele encontra-se no Park Hotel de Nova Friburgo (RJ).
Costa assinou todo projeto - a pensão de 12 quartos uniu a tecnica e materiais locais com o modernismo da época. Inflelizmente hoje os herdeiros da Familia Ginle não tem os recursos necessários para manter o hotel, que está fechado a quatro anos e precisa de reformas estruturais e os móveis estão em péssimo estado de conservação.

.::"No Park Hotel, temos estrutura aparente, mas de toras roliças de madeira; amplas vidraças, mas que incluem uma fileira de janelas guilhotina; muita luz, mas filtrada por venezianas de madeira ou cortinas de renda. A aparente simplicidade da arquitetura reserva uma experiência estética muita rica aos seus visitantes. Arquitetura e mobiliário propõe um jogo múltiplo de contrastes sabiamente orquestrado. Contrastes entre volumes, contrastes entre materiais, contrastes formais e cromáticos. Entre a pequenina recepção e o amplo espaço que reúne bar, sala de estar e refeitório. Entre o térreo de amplas janelas envidraçadas e o andar de varandas enfileiradas de treliça. No térreo, entre os espaços cheios (salas de estar e de jogos) bem plantados no solo e o espaço vazio intermediário no qual está situada a varanda suspensa. A parede em diagonal que estreita a sala de estar na proximidade da varanda introduz com maestria a irregularidade. Entusiasmado com o projeto, Lucio Costa desenhou a maioria dos móveis e luminárias. Sua filha Maria Elisa Costa supõe que foram realizados artesanalmente em pequenas marcenarias, serralherias ou oficinas de estofados. Para os quartos e respectivas varandas ele desenhou a cama de pés recuados que parece flutuar; a mesinha de cabeceira fixa de tampo sinuoso; mesas de apoio; a espreguiçadeira regulável; a banqueta para mala; o banquinho e as arandelas. Para a sala de estar: a lareira, a mesa de centro, as mesas de jantar, o bar sinuoso, os bancos altos, o sofá, as poltronas e as luminárias de ferro. Todos os móveis são leves, confortáveis e bem proporcionados. A elegância discreta tem uma presença quase anônima. Ao comparar os esboços aos móveis efetivamente realizados, observamos o aprimoramento no sentido da adequação e da simplicidade. O arquiteto descartou a realização para os quartos de uma mesinha de apoio com estrutura tubular de ferro, que seguia a linguagem industrial de Marcel Breuer, em favor de uma mesinha redonda delicadíssima de dois andares em madeira."::. ( texto - SOS Park Hotel Gilberto Paim).
Graças a sua tremenda organização, Lucio Costa é o arquiteto que tem o maior acervo. Guardava todo tipo de rascunho, hoje catalogados na Casa deLucio Costa.
Sua filha, Maria Elisa Costa, teve o pai como mestre, apresentou-lhe a Le Corbusier a quem a arquiteta se apaixonou pelo traço e foi figura presente em sua infância. O documenetário O Risco: Lúcio Costa e a Utopia Moderna (2002), conta a história da construção de Brasilia e mostra a real importancia desse brasileiro.Além de vários artigos (leia alguns deles aqui no site do vitr uvius), escreveu também o livro Arquitetura (editora José Olympio).Já fomam escritos vários livros póstumos, o mais importante Com a palavra, Lucio Costa, organizado por Maria Elisa Costa (editora Aeroplano).

Lucio Costa faleceu aos 96 anos de idade, lúcido no ano de 1998. Era considerado um homem tímido, até irônico.

"Não sou, jamais fui, modernista. Aliás, tenho horror a esse conceito que me soa falso, mas sempre participei dos movimentos de renovação válida."

...::Um recado – e um apelo – de Lucio Costa. Por Maria Elisa Costa
Ouvi tantas e tantas vezes de meu pai a recomendação que segue que faço questão de transmiti-la a vocês que cuidam, sobretudo nas pontas, do nosso patrimônio construído.
Trata-se dos cachorros dos beirais coloniais: os cachorros devem ser BRANCOS, e não pintados de cor, como virou moda de uns tempos para cá. Brancos como são na casa de Chica da Silva e na Biblioteca de Diamantina, ou em todo o conjunto do centro histórico de Paraty.
E isto porque quando se pinta de cor os cachorros, é quebrada a continuidade visual do beiral, assegurada pela monocromia. Os cachorros pintados de cor introduzem uma presença “tracejada” que compromete a intenção da arquitetura, que quer ali uma linha contínua: é como se um pequeno e renitente som agudo perturbasse a linha melódica de uma canção que não o incluía.
Cabe lembrar que Paraty conseguiu recuperar os beirais brancos graças à atuação de Edgard Jacintho, pelo IPHAN – “Educação Patrimonial”, a meu ver, começa por aí.
Uma outra observação diz respeito à questão das cores nas portas e janelas. Quando estive em Goiás, observei que freqüentemente os enquadramentos das portas e janelas e as folhas de madeira cheia são pintados da mesma cor, em tons diferentes (azul escuro-azul claro, vermelho escuro-vermelho claro, etc).
Independente de prospecções, o vocabulário cromático da arquitetura colonial usa outro tipo de acorde, partindo da palheta clássica – azul, verde, vermelho ferrugem, ocre – onde sempre são usadas duas cores diferentes – e não dois tons da mesma cor – ou então a mesma cor, no mesmo tom – os caixilhos das vidraças sempre pintados de branco.
Para concluir, é importante observar que o tom do ocre usado nas igrejas deve ser o mais próximo possível da cor da pedra, ou seja, em geral um ocre mais seco (como no Carmo de Ouro Preto) e menos amarelo do que o que tem sido utilizado em restauros recentes em Minas Gerais::...

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